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Untold: Swamp Kings e Johnny Football – O que não foi contado e continua não sendo

Essa é uma história triste. Uma história em que, mesmo uma pessoa já calejada pelos inúmeros bons trailers de filmes ruins, se deixou enganar. Ou quase. As pistas estavam todas ali, só não descobriu o segredo (Urban Meyer todo faceiro dando entrevista) quem não quis. 

Vou explicar melhor. Na metade de agosto a Netflix lançou mais uma temporada de sua série Untold, série de documentários que tinha como premissa contar grandes escândalos do mundo esportivo. Havia assistido alguns títulos da temporada passada e havia gostado, em especial o que contava a história do Malace at the Palace, quando um grupo de jogadores da NBA subiu as arquibancadas e socou vários torcedores (foi louco). 

Untold: Swamp Kings e Johnny Football - O que não foi contado e continua não sendo

Apesar de contar com a produção de um dos envolvidos (o pivô dos Pacers, Jermaine O’Neal), o doc não era nada chapa branca. Tinha depoimentos de vários envolvidos: jogadores, torcedores, árbitros e dirigentes. Mesmo não sendo um dos melhores documentários esportivos da história, ele cumpria o seu papel de contar a história.

Não à toa quando saíram os trailers dos novos episódios dessa série eu fiquei empolgado. Por dois motivos. O primeiro, estava de férias, ou seja, teria que gastar meu tempo. O segundo motivo eram os assuntos, ambos ligados ao futebol americano universitário. 

Um dos documentários era sobre Johnny “Football” Manziel, um dos jogadores mais controversos a passar pela modalidade universitária e pela NFL. O outro era ainda mais interessante, pois contaria a história do Florida Gators dos anos 2000, time conhecido pelos escândalos – e que teve entre os seus jogadores pelo menos um serial killer – e o melhor, seria uma série de 4 episódios.

Ou seja, conteúdo não faltava. Era só nos apresentar todos os escândalos, controvérsias e recontar todas aquelas histórias mal contadas que apareciam de vez em quando nos tablóides e telejornais esportivos da mídia norte-americana. Mas, infelizmente, Untold não contou nada de novo. De uma certa maneira, do jeito que foram conduzidos, às sérias mais escondem a história do que revelam segredos. 

A história de Johnny Football

Untold: Swamp Kings e Johnny Football - O que não foi contado e continua não sendo

Verdade seja dita, o documentário sobre Manziel até que tem seus momentos, mesmo assim fica um gostinho de que nem tudo foi explicado. Para quem desconhece a história, Johnny Manziel foi o principal quarterback do futebol americano universitário na primeira metade da década passada. Com jogadas espetaculares, ela capturou corações e almas dos torcedores da Universidade do Texas A & M e ganhou o apelido de Johnny Football.

Ainda na universidade começaram as controvérsias. Manziel não era conhecido por levar o time a vitórias improváveis, mas também gostar de uma festinha – várias festinhas na verdade – com muita bebida que pisca, droguinhas recreativas e copos de plástico vermelho. Mesmo assim – e por não ter nem 20 anos, o corpo aguenta muita coisa – dentro de campo Manziel era imparável e transformou o time dos Aggies em candidatos ao título.

No intervalo entre as temporadas, Manziel criou, junto com um brou, um esquema para ganhar uma graninha em cima de autógrafos, esquema completamente proibido pela organização mafiosa que coordena os esportes universitários norte-americanos, a NCAA. E com o dinheiro que ganhou nesse esquema, adivinha o que ele fez? Óbvio, aquele telefone com notas de dólares e mais festinhas.

O jogador chegou a ser suspenso por meio jogo (!) e quando voltou a campo começou a fazer seu clássico sinal de “me dê meu dinheiro”. Um provocador nato. A segunda temporada foi quase tão boa quanto a primeira e Manziel entrou no draft da NFL como uma das melhores apostas da posição.

Untold: Swamp Kings e Johnny Football - O que não foi contado e continua não sendo

Apesar de contar com muitas imagens exclusivas feitas por Manziel e seus miguxos (bros muito bros, como você pode imaginar), comentar sobre seu vício, sua carreira em frangalhos e suas diversas rehabs, ainda assim o documentário parece deixar boa parte da história de lado, quase que como esperando uma continuação, afinal a primeira cena dele é de Johnny e seus parças fumando um e fazendo um churras. Ou seja, será que ele aprendeu alguma coisa com isso?

Mas para ter acesso a essas imagens exclusivas o documentário pagou o preço de ser um veículo de relações públicas de Johnny Manziel. Ele peca em tentar amenizar um pouco a imagem de Johnny Football, quase que o transformando em um anti herói, criando uma história que carece de profundidade.

Porém ,após assistir a história de Johnny Football eu não fiquei decepcionado, não é um documentário perfeito, mas não chega a ser ruim. E me preparei para as 4 partes de Swamp King. Rapaz, isso sim foi uma decepção.

UnTold, o documentário como projeto de Relações Públicas

O time de futebol americano da Universidade da Flórida, o Florida Gators, dominou o esporte no final da primeira década dos anos 2000. O time ganhou dois campeonatos nacionais e diversos foram os jogadores que, anos depois, tiveram carreiras de sucesso na NFL. Mas credenciais como essa, diversos times e faculdades tem, o que torna os Gators dessa época tão interessante foi a quantidade de escândalos, durante e depois, que os jogadores e comissão técnica se envolveram ao longo dos anos.

Para se ter uma ideia, mais de quarenta jogadores tiveram passagem pela polícia, inclusive enquanto jogavam pelos Gators: as acusações são inúmeras: teve jogador que simplesmente tirou uma AK-47 do porta-mala do carro e disparou para cima na frente de uma boate; teve jogador acusado de roubar laptops; teve jogador mandando ameaças de morte para a namorada (e que, surpresa, assassinou ela anos depois) e por aí vai. 

Untold: Swamp Kings e Johnny Football - O que não foi contado e continua não sendo

Dentro do vestiário o clima também era bem ameno. Percy Harvin, um wide receiver  talentoso e que fez algum sucesso na NFL, apenas agarrou pelo pescoço um dos técnicos da equipe. Teve jogador que quebrou a bacia de tanto levantar peso e o técnico da equipe, Urban Meyer, jogava garrafas de Gatorade nos atletas sem motivo.

Por falar em Urban, esse é um personagem especial. Depois que o sucesso com os Gators acabou, ele decidiu se aposentar… para logo depois assumir uma outra equipe de prestígio do esporte colegial, Ohio State. Nos Buckeyes ele também fez sucesso e polêmica, especialmente depois que a história que um de seus técnicos mais importantes foi acusado de abusar mental e fisicamente da esposa. Urban sabia e não fez nada. Depois de um tempo saiu de Ohio State para assumir um time da NFL, o Jacksonville Jaguars, naquilo que foi chamado de pior trabalho de um técnico na liga.

Nos Jaguars ele criou um reino de terror, seguidamente ameaçando os jogadores e os técnicos com demissões ou cortes, os insultando e humilhando na frente de todo mundo. O desempenho do time foi uma vergonha e ele foi demitido antes de terminar uma temporada (fato raro na liga). Meyer foi acusado de contratar um treinador racista, abandonar seu time para ir atrás de jovens mulheres, chutar um jogador, entre uma série de outras reclamações.

Mas o principal fato envolvendo os Gators fora de campo foi o caso Aaron Hernandez, acusado de múltiplos homicídios e condenado à prisão perpétua. O caso foi tão emblemático que virou seu próprio documentário, “Aaron Hernandez: a mente do assassino”, também do Netflix. Sobre esse documentário eu não tenho opinião, pois não sou chegado em true crime e serial killers. Mas já em relação ao Untold…

Realmente, nada foi dito

O começo do documentário mostra como o Florida Gators era um time empacado na mediocridade e que a chegada de Urban Meyer deveria mudar tudo, afinal ele era um jovem e promissor técnico que havia levado universidades menos expressivas a grandes temporadas.

E é isso. O documentário todo é mostrando como Urban foi genial, como os jogadores o adoravam e como o time ganhou tudo. Nada de polêmicas, nada de escândalos, uma versão “acredite nos seus sonhos”, uma realidade distorcida. Urban é retratado com um gênio tático e motivacional e é responsável pela maior parte das entrevistas.

A segunda maior participação é do quarterback Tim Tebow, o anjo entre os demônios. Extremamente religioso, Tebow foi uma sensação no nível universitário, mas não emplacou no profissional. Ao contrário de Johnny Football, que queria festinhas e droguinhas, Tebow só não era bom o bastante. Esforçado, cheio de bons sentimentos, mas um jogador ruim.

E no final temos isso, essa peça de relações públicas de Urban Meyer (e Tebow) que serve para ressuscitar a imagem pública do treinador. Ele só existe porque os criadores do documentário queriam acesso às imagens exclusivas registradas na época. Imagens que nada mais são que estudantes universitários puxando ferro a ponto de vomitar, estranhas competições dentro do vestiário em que os jogadores lutam no chão e uns gritos de guerra genéricos.

Untold: Swamp Kings e Johnny Football - O que não foi contado e continua não sendo

Swamp Kings é uma grande perda de tempo. Não conta nada, não aprofunda, não questiona. Depois de séries documentais esportivas da qualidade de Last Dance (produzida pelo Michael Jordan e que mostra como ele podia ser um babaca quase sempre as vezes) ou OJ Made in America, um verdadeiro tratado sociológico sobre a América negra misturado com a biografia de um atleta sensacional e perturbado, esse documentário deveria afundar no pantano de ruindade no qual ele foi gerido.

Para mais opiniões abalizadas sobre documentários esportivos que ninguém se importa, acesse o restante do blog. E não se esqueça de deixar seu comentário.

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